Bolsonaro desaba em popularidade digital após nota retórica sobre o 7 de Setembro
Logo após os atos do 7 de Setembro que mobilizaram sua base em demonstração de apoio, o presidente Jair Bolsonaro teve um tombo de popularidade nas redes sociais ao divulgar uma carta em que volta atrás nos ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e nas ameaças golpistas.
O IDP (Índice de Popularidade Digital) de Bolsonaro, medido pela consultoria Quaest, mostra que as manifestações do Dia da Independência fizeram Bolsonaro chegar ao seu segundo melhor patamar desde o início do ano, com 81,8 pontos.
Marcas maiores, em torno de 83 de pontos, foram vistas apenas no início de janeiro e no começo de maio, na esteira da motociata do presidente em Brasília.
Já no dia 8, o índice cai para 62,4 e vai diminuindo ainda mais para 53,7 na quinta (9), dia da divulgação da carta, e 37,1 na sexta (10) —a pior marca de Bolsonaro em 2021.
Sua popularidade digital chegou a variar em torno de 37 pontos somente no início de julho, quando a CPI da Covid avançou sobre suspeitas de corrupção na compra de vacinas.
“Os atos do dia 7 trazem uma criação de expectativa. Bolsonaro foi capaz de fazer algo que quase ninguém hoje consegue, que é gerar expectativa. O processo de mobilização coordenada para os atos foi todo positivo para o presidente. O problema é que depois a euforia se transformou em frustração”, resume Felipe Nunes, cientista político, professor da UFMG e diretor da Quaest.
Como mostrou a Folha, a nota retórica de Bolsonaro deixou atordoada e silenciosa, em um primeiro momento, a base de apoiadores do presidente, que se decepcionou com a sinalização de moderação patrocinada pelo ex-presidente Michel Temer (MDB).
Após os atos em que Bolsonaro ameaçou a democracia, boa parte do mundo político, sobretudo a oposição, além do presidente do STF, Luiz Fux, condenou uma tentativa de ruptura institucional, o que elevou a pressão crítica sobre o presidente.
Algo que a nota não conseguiu reverter —dado o descrédito na suposta moderação do presidente.
Por outro lado, os bolsonaristas, desmobilizados e desiludidos com a carta, não defenderam o mandatário nas redes, o que fez desabar seu IPD. “Foram movimentos que desagradaram a oposição e a base”, resume Nunes.
A métrica do IPD avalia o desempenho de personalidades da política nacional nas plataformas Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google. A performance é medida em uma escala de 0 a 100, em que o maior valor representa o máximo de popularidade.
São monitoradas seis dimensões nas redes: fama (número de seguidores), engajamento (comentários e curtidas por postagem), mobilização (compartilhamento das postagens), valência (reações positivas e negativas às postagens), presença (número de redes sociais em que a pessoa está ativa) e interesse (volume de buscas no Google, YouTube e Wikipedia).
Os dados do IPD mostram que a mobilização e o trabalho político de Bolsonaro para o Dia da Independência foram perdidos nos três dias seguintes. O início da queda, no dia 8, foi influenciado pelo pedido de Bolsonaro para que caminhoneiros que o apoiam desbloqueassem as estradas.
Segundo a consultoria, os 40 dias que antecederam os atos tiveram mais de 3 milhões de postagens com esse tema. Assim como nas ruas, também nas redes o 7 de Setembro funcionou como uma demonstração de força de Bolsonaro.
“A base do presidente vinha muito engajada, mas essa euforia enorme, quando se transforma em ‘arregou’, deixa a base sem argumento”, afirma o professor.
Horas após a carta, no entanto, explicações começaram a aparecer de forma sistemática nos grupos virtuais bolsonaristas. As teses variavam entre a nota fazer parte de uma estratégia de Bolsonaro ou de um suposto acordo com o STF.
Nunes afirma que Bolsonaro tem condições de recuperar seu IPD. Ele é, entre os presidenciáveis e líderes políticos, quem tem maior IDP médio desde janeiro de 2019.
“A base fiel de Bolsonaro é muito organizada, engajada e mobilizada. Acredito que essa frustração pode ser canalizada em prol do projeto maior, que é a manutenção do bolsonarismo no poder. Isso tende a arrefecer essa angústia deles e pavimentar um caminho de recuperação”, diz o diretor da Quaest.
Com a queda, Bolsonaro se aproximou do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no ranking do IPD, mas isso não significa que o petista tenha ocupado o vácuo de popularidade do presidente nas redes.
Em agosto, com a viagem ao Nordeste, Lula teve alta em sua popularidade digital. O ex-presidente também teve alta no dia 6, com seu pronunciamento sobre o Dia da Independência, atingindo 59 pontos. Depois disso, porém, terminou a semana com índice de 44,6.
A análise do IPD aponta ainda para a série de dilemas que envolve o governo Bolsonaro de forma geral. Isso porque, segundo Nunes, está claro que “a base bolsonarista, de fato, se mobiliza mais conforme mais radicalizado é o discurso do presidente”.
Com isso, Bolsonaro se torna “refém” dos seus apoiadores. Do ponto de vista eleitoral, o paradoxo é o de que “o processo de radicalização parece garantir a ida de Bolsonaro para o segundo turno, mas impede que se conecte com o eleitor mediano”, afirma Nunes.
Já em relação à manutenção do cargo de presidente, em meio à ameaça de impeachment diante do discurso de ruptura institucional, o impasse é, ainda de acordo com o cientista político, entre “radicalizar para manter as chances eleitorais e se moderar para cumprir as exigências do mundo político”.
“Bolsonaro está na corda bamba entre agradar a base e respeitar as instituições, o que gera uma criação necessária de instabilidade”, diz Nunes. Aqui há outra contradição, uma vez que a instabilidade atrapalha o crescimento econômico, algo que também impulsionaria Bolsonaro na eleição de 2022.